quarta-feira, 20 de maio de 2020

Sivuca 90 anos




Moacir:   Gostaria que você,contasse um pouco da sua historia?

Sivuca: Vou começar pelo começo mesmo;  Nasci numa cidade chamada Itabaiana, no Estado da Paraíba.  Nome:  Severino Dias de Oliveira.  Daí eu fui crescendo e com quatro anos eu já tocava uma harmônica, daquelas tipo gaita de boca.  Nesse caso, só tocava aquelas músicas que as pessoas cantavam.  

Naquele tempo a comunicação era difícil, a música saía do sul  e quando chegava no nordeste estava completamente deturpada e eu comecei a tocar aquelas deturpações.

Em 1939, meu pai comprou a primeira sanfona, uma brincadeira de criança que ele comprou pra gente, para meu irmão mais velho e para  mim.  Isso foi precisamente numa terça-feira. 

  Ele chegou com essa sanfona, era uma hora da tarde, e eu me lembro de um lance muito engraçado:  
quando ele chegou com a sanfona, ele tinha bebido um pouco, lá na cidade, chegou meio lá, meio cá e trouxe a sanfona, um pote cheio de mangaba, que é uma fruta muito gostosa lá do nordeste e um gatinho novo, amarelo no bolso do paletó. A primeira coisa que eu consegui tocar no instrumento foi Jardineira. 

  Em 1940, fiz o primeiro baile profissional,já acompanhado por pandeiro e cavaquinho.  Toquei até às cinco horas da manhã.  Daí não larguei mais.  Toda semana, baile de estudante, essa coisa toda.  Até 1945 quando fui para Recife, trabalhar numa estação de rádio que naquela época ,o máximo que um músico podia conseguir era trabalhar, empregado, numa estação de rádio.

Moacir: Com programas ao vivo?

Sivuca:  Exatamente. Tinha grandes grupos tocando, grandes orquestras.  Fiquei três anos nesta rádio, depois mudei para uma outra moderna que tinha inaugurado que era a Rádio Jornal do comércio, uma rádio muito grande.  

Já tinha aprendido um pouco de música, quando cheguei na Rádio Clube, mas quando fui para a Rádio Jornal do Comércio eu tive a chance de conhecer o maestro Guerra Peixe que foi contratado.  Foi Guerra que me ensinou em dois anos,sobre música, o que eu talvez levaria vinte anos, num conservatório, e não conseguiria aprender. O Guerra foi tudo para mim.  Foi meu mentor musical
Moacir: Nessa época você já tinha passado  pelo grupo Mundo pegando fogo ?

Sivuca:  Não.  A história do fogo é muito engraçada.  É o seguinte:  Nós estávamos na calçada, na estação de rádio, quando chegaram dois garotinhos um de doze e outro de uns quinze anos mais ou menos, tudo albino, entendeu?  E o pai com a sanfona debaixo do braço dizendo que vieram de Alagoas e que eles tocavam.  

Eu achei interessante pedi para eles tocarem.  Eles tocaram.  Um tocava direitinho, mas o outro, eu senti que além de tocar, tinha muita coisa para oferecer à gente.  Eu chamei o diretor da rádio, imediatamente e disse:  Contrata esses dois meninos que eles são bons.  A gente pensou:  vamos fazer um grupo que chama assim:  Um mundo pegando fogo, mas esse grupo só teve o título porque nunca tocou. 

  O Hermeto foi para Caruaru, era menino, e bem mais novo que eu, uns oito anos .  Ele foi trabalhar, foi tocar numa rádio em Caruaru e o irmão, foi tocar na rádio de Garanhuns.  

O Hermeto, acredito que ele começou a quebrar instrumento nessa época, porque quando eu saí da rádio, tinha lá sanfona alemã, que não era grande coisa. 

O Hermeto começou à tocar com ela.  Depois eu soube que ele um dia teve tanta raiva dela, que episou em cima dela e quebrou toda, mas isso são detalhes...  

Para mim o Hermeto é o Beethoven do séc. XX. 


Trecho inédito de entrevista em 1985

Moacir Oliveira

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